domingo, 9 de junho de 2013

Questões sobre proporcionalidade e razoabilidade



Por Prof.  Daniel Giotti


O tema da proporcionalidade e razoabilidade, que em meados da última década esteve no epicentro do debate constitucional brasileiro, tem sido cobrado em provas de concurso público. Por isso, listam-se algumas questões:

I)TÉCNICO TCU 2012 – DIREITO CONSTITUCIONAL

A respeito dos princípios previstos na Constituição Federal de 1988 (CF), julgue os itens seguintes.

32 O princípio da proporcionalidade ou da razoabilidade é um princípio constitucional não positivado.
II) ADVOGADO DO BNDES  2013 – DIREITO CONSTITUCIONAL
61. Recorre-se ao princípio da proporcionalidade para aferir a legitimidade de um ato do poder público que restringe um direito fundamental visando a alcançar um fim que também tem base constitucional.
O princípio da proporcionalidade impõe o exame do ato quanto a
(A) adequação e necessidade 
(B) unidade e excesso
(C) impessoalidade e moralidade 
(D) razoabilidade e eficiência
(E) legalidade e efetividade

Antes de se tratar das questões propriamente, cabem algumas digressões sobre a proporcionalidade e a razoabilidade.

Embora a doutrina brasileira venha se esmerado em definir a natureza jurídica da proporcionalidade, os autores se dividem entre considerá-la princípio (Wilis Santiago Guerra Filho; Luís Roberto Barroso), regra (Virgílio Afonso da Silva) e postulado (Humberto Ávila).

De qualquer sorte, prepondera na doutrina e em julgados, além de em manuais, nos enunciados de questões e em textos jurídicos, a afirmação de que a proporcionalidade seria um princípio. Há, inclusive, uma explicação para esse uso, atrelada a uma função de predominância da proporcionalidade entre as normas jurídicas do sistema, a ponto de Willis Santiago Guerra Filho chamá-lo de “princípio dos princípios”.

Por outro lado, ante a própria formulação de Alexy, pela qual princípio é um mandato de otimização, um dever prima facie, seria impróprio dizer que a proporcionalidade é um princípio, já que é aplicada de forma constante, no método tudo-ou-nada, sem variações fáticas ou jurídicas.

Independentemente de qual a natureza, entende-se que a proporcionalidade, possuindo uma estrutura racional definida, apresenta três subelementos: adequação, necessidade e proporcionalidade. Desse modo, em havendo colisão entre os princípios jurídicos, aplicam-se as regras da adequação, necessidade e proporcionalidade em sentido estrito.

Por adequação, a maioria da doutrina entende que o meio deve levar à realização de um fim, mas Luís Virgílio Afonso da Silva pondera que melhor seria dizer que meio adequado é aquele apto a fomentar o resultado pretendido, afirmando que o verbo correspondente em alemão fördern, em verdade, significa fomentar, promover. A questão não é apenas terminológica, como se vê, já que levar a realização de um fim não é o mesmo que promover um fim ou fomentá-lo.  O controle fica mais eficaz, caso se parta da análise da promoção ou do fomento da medida em relação ao fim buscado.

A necessidade, por outro lado, é um juízo do intérprete acerca dos meios utilizados, investigando-se acerca da existência ou não de meios alternativos àquele inicialmente escolhido e que, ao mesmo tempo, promovam o fim buscado sem restringir com o mesmo grau os direitos fundamentais tutelados.

Finalmente, a proporcionalidade em sentido estrito envolve a comparação entre a importância da realização do fim e a intensidade da restrição aos direitos fundamentais. Os motivos que fundamentam a realização do fim devem ter importância a ponto de justificarem a restrição dos direitos fundamentais que a medida acarreta.

Não se pode esquecer, porém, de que entre esses elementos há um caráter subsidiário.

Infelizmente, os Tribunais brasileiros têm confundido proporcionalidade e razoabilidade e, quando alegam aplicá-los, não se dão ao trabalho de empreender uma argumentação sólida, sobretudo no caso da proporcionalidade, que exige dos intérpretes a análise dos elementos estudados.

Luís Roberto Barroso considera-os, então, como fungíveis.

A razoabilidade, porém, possui vários sentidos possíveis.  Pode ser vista a razoabilidade como um dever de eqüidade, ou seja, impingindo a harmonização de uma norma geral a um caso individual, como o afastamento da regra geral de que o acesso aos cargos se dá por concurso público afastada para uma situação de contratação de uma gari, sem concurso público, para trabalhar por apenas nove meses, exemplo relatado por Humberto Ávila em seu artigo “Razoabilidade, moralidade e eficiência na atividade administrativa” (http://www.estig.ipbeja.pt/~ac_direito/HAvila.pdf).

Um segundo sentido para razoabilidade é como dever de congruência. Razoabilidade existe apenas se a norma harmonizar-se com suas condições externas de aplicação. Toma-se como exemplo de norma irrazoável, por ofender o dever de congruência, aquela que aumentava o prazo decadencial para propositura de ações rescisórias, de dois para cinco anos, (STF, Pleno ADI n. 1753-2, Rel. Min. Sepúlveda Pertence, DJ em 12.06.98).

Finalmente, tem-se a razoabilidade como um dever de equivalência entre a medida adotada e o critério que dimensiona. Com esteio na jurisprudência pátria, Humberto Ávila reputa como irrazoável, por não atender à equivalência, taxa judiciária de percentual fixo, pois não existiria, em alguns casos, equivalência entre o custo dos serviços prestados.

Disso tudo, fica claro, portanto, que  apenas a proporcionalidade se exige uma relação de causalidade entre os fins buscados e os meios utilizados, que devem ser adequados, necessários e proporcionais.

O fundamento para tanto uma, quanto outra, varia conforme a posição doutrinária. Há quem veja proporcionalidade e razoabilidade como decorrências da idéia de Estado de Direito ou mesmo da existência de direitos fundamentais. Parece ser essa a opção da doutrina germânica. Entre os teóricos norte-americanos e britânicos, porém, é mais habitual buscar o fundamento de ambos no devido processo legal, em seu sentido substancial.

Seja como for, a verdade é que, expressamente ou explicitamente, não há previsão constitucional de qualquer deles. Entretanto, quase houve. A EC 19,  em vez de acrescentar a eficiência como princípio da Administração Pública, acrescentaria a proporcionalidade.

Há previsão, porém, no direito positivo federal, pois a lei ordinária n. 9.784/99 coloca como princípios aplicáveis ao processo administrativo a proporcionalidade e a razoabilidade.

De qualquer sorte, está CERTA a primeira questão, de concurso organizado pelo CESPE, já que proporcionalidade e razoabilidade podem ser encontradas, sobretudo, a partir do devido processo legal, que tem previsão no artigo 5o, da Carta da República.

A segunda questão traz indagação recorrente, no sentido de se aquilatar do candidato o conhecimento dos elementos analíticos da proporcionalidade: adequação, necessidade e proporcionalidade em sentido restrito, sendo o gabarito a letra “a”.

O Direito Revisto – Jun/13
Publicado originalmente em: Prof. Daniel Giotti

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