quinta-feira, 21 de março de 2013

A retirada do feto anencéfalo

Por Edison Tetsuzo Namba

O Supremo Tribunal Federal, em julgamento iniciado em 11.4.2012, em seu Plenário, por maioria de votos, julgou procedente o pedido na Arguição de Descumprimento de Preceito Fundamental (ADPF) 54, ajuizada pela Confederação Nacional dos Trabalhadores na Saúde (CNTS), para declarar a inconstitucionalidade de interpretação segundo a qual a interrupção da gravidez de feto anencéfalo é conduta tipificada nos artigos 124, 126 e 128, incisos I e II, todos do Código Penal.

Na anencefalia, existe malformação do cérebro e do crânio causada por problemas genéticos e fatores externos. Esse problema ocorre, geralmente, entre a terceira e a quarta semana de gestação. Pelo ultrassom visualiza-se o achatamento da cabeça do feto, causada pela ausência dos hemisférios cerebrais.

O feto nessa situação não teria condições de sobrevivência e, principalmente por essa razão, argumentos favoráveis e desfavoráveis foram expostos.

Dentre os argumentos contrários à retirada do feto acéfalo estaria o respeito à sua individualidade, ou seja, com a união dos gametas, óvulo e espermatozoide, já existiria um ser humano, sem a possibilidade de lhe causar algum mal (princípios da beneficência e não maleficência, insertos no estudo da bioética).

Permitindo-se a retirada do feto, estar-se-ia violando sua dignidade, pois, conforme defendido, já é uma pessoa humana, dessa forma, deve ser respeitado e tratado com igualdade a qualquer outra pessoa (princípio da justiça, também exaltada na bioética).

Desde a concepção, o “nascituro”, aquele que nascerá, tem seus direitos e o principal é o direito à vida, assim, retirar essa possibilidade do feto anencéfalo não estaria em cogitação (art. 2º do Código Civil).

Enfim, a vida é um direito inviolável e intransigível, portanto, o feto naquela condição só poderia ser privado de sua vida por consequências próprias de sua situação e não causada com a intervenção e vontade de terceiros.

De outro lado, aqueles que defendem a possibilidade da retirada do feto, em primeiro lugar, destacam a premissa supramencionada, ou seja, a mulher dará a luz a uma criança sem qualquer possibilidade de sobreviver. Isso causaria um trauma nos pais, afetaria suas dignidades (deve-se preservar a escolha de ambos para a retirada do feto, com incidência do princípio da autonomia, também preconizada pela bioética).

Existe um alto risco para a gestante, na qual há problemas como eclampsia e embolia pulmonar, logo, entre a vida inviável e aquela já existente, opta-se por esta última, aliás, fato a excluir a antijuridicidade no caso de “aborto” (art. 128, inciso I, do Código Penal – aborto necessário).

Não se priva alguém de qualquer dignidade ou vida, mesmo porque não sobreviverá, procura-se, isso sim, não postergar o sofrimento de uma família, já traumatizada com a notícia da existência da anomalia em comento.

Em outras palavras, não se “aborta” um feto anencéfalo, ao contrário, evita-se a continuidade de uma vida inviável, sem perspectiva.

Pelas orientações mostradas, conservadoras e liberais, bem se vê a influência da tecnologia nas relações humanas. O avanço científico propiciou diagnosticar a existência do feto sem a calota craniana e, via de consequência, expulsá-lo do corpo materno. Isso gera a necessidade do debate bioético, sem deixar de lado o biodireito.

A decisão do Supremo Tribunal Federal auxilia nesse progresso da humanidade, pois se tem uma posição frente à inusitada situação. Os direitos e valores de séculos passados, por vezes, não podem incidir numa situação mais contemporânea e, porque não dizer, pós-contemporânea.

O Direito Revisto - Mar/13

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