A redução da
maioridade penal, na atualidade, constitui tema bastante polêmico, devido aos
aspectos políticos, biológicos, sociais, filosóficos etc. que a matéria
envolve. Disso decorre a dificuldade prática, entre juristas e integrantes da
sociedade como um todo, de se chegar a um consenso, a uma solução unânime sobre
o tema.
Sabemos que a
maioridade penal ocorre aos 18 anos, conforme determinação constitucional (CF,
art. 228). Abaixo desse limite de idade, presume-se a incapacidade de
entendimento e vontade do indivíduo (CP, art. 27). Pode até ser que o menor
entenda perfeitamente o caráter criminoso do homicídio, roubo, estupro, tráfico
de drogas, mas a lei presume, ante a menoridade, que ele não sabe o que faz,
adotando claramente o sistema biológico nessa hipótese.
Nesses casos, os
menores de 18 anos, apesar de não sofrerem sanção penal pela prática de ilícito
penal, em decorrência da ausência de culpabilidade, estão sujeitos ao
procedimento e às medidas socioeducativas previstas no ECA (Lei n. 8.069/90),
em virtude de a conduta descrita como crime ou contravenção penal ser
considerada ato infracional (veja art. 103 do ECA). No caso de medida de
internação, o adolescente é liberado compulsoriamente aos 21 anos de idade.
Na atualidade,
porém, temos um histórico de atos bárbaros, repugnantes, praticados por
indivíduos menores de 18 anos, os quais, de acordo com a atual legislação, não
são considerados penalmente imputáveis, isto é, presume-se que não possuem
capacidade plena de entendimento e vontade quanto aos atos criminosos
praticados.
A grande questão
é: como podemos, nos dias de hoje, afirmar que um indivíduo de 16 anos não
possui plena capacidade de entendimento e volição?
Estamos “vendando”
os olhos para uma realidade que se descortina: o Estado está concedendo uma
carta branca para que indivíduos de 16, 17 anos, com plena capacidade de
entendimento e volição, pratiquem atos atrozes, bárbaros.
Ora, no momento em
que não se propicia a devida punição, garante-se o direito de matar, de
estuprar, de traficar, de ser bárbaro, de ser atroz.
Mesmo
considerando-se aspectos da realidade educacional e a omissão do Estado em
prover a orientação adequada para os jovens, ainda assim, a redução da
maioridade penal é medida justa.
Até porque, se ponderarmos esses fatores,
aquele que praticou um crime com 18, 20, 21 anos, o fez porque não teve
oportunidade, também, de emprego, estudo etc. Por isso, tal argumento não pode
ser levado em consideração para afastar a redução da maioridade penal.
Dessa forma, o que
se pretende, na realidade, é o distanciamento desses discursos ideológicos,
políticos etc., a fim de proporcionar a retribuição penal na justa dimensão do
crime cometido, atendendo, inclusive, ao princípio da proporcionalidade
insculpido na Constituição Federal, a qual exige maior rigor penal para os
casos de maior gravidade (art. 5.º, XLII, XLIII e XLIV).
O intuito,
portanto, da redução da maioridade é o de reparar tão graves injustiças, de
propiciar a punição na proporção do crime praticado. Assim, um menor de idade
que pratique um crime hediondo, como o que ocorreu no bairro do Belém (SP),
deverá responder pelo crime tal como um indivíduo maior de 18 anos.
É extremamente
injusto que, após cometer tão bárbaro crime, seja liberado compulsoriamente aos
21 anos, nos termos do ECA, ao passo que um indivíduo de 18 anos que tenha
coparticipado do crime pode ficar segregado por até 30 anos em estabelecimento
carcerário.
E o que é pior:
aos 21 anos, quando for liberado, esse indivíduo estará novamente no seio da
sociedade, voltando-se, outra vez, contra a população indefesa e aterrorizada.
Há, no entanto,
mais uma alternativa para a solução desse problema, caso haja resistência na
sociedade no tocante à redução da maioridade penal. De acordo com o ECA, no
caso de medida de internação, o adolescente é liberado compulsoriamente aos 21
anos de idade. Pois bem. Seria viável uma modificação legislativa no sentido da
alteração desse limite de idade, o qual passaria a ser de 30 anos. Com isso,
seria possível evitar o problema da liberação rápida do infrator e a sensação
de impunidade.
Dessa forma, não
podemos mais insistir em discurso estéril, isto é, de que prisão ou Fundação
Casa (Centro de Atendimento Socioeducativo ao Adolescente) não regeneram, ou de
que o Estado deveria proporcionar condições sociais e educacionais ao menor. É
claro que essas medidas são a pedra fundamental e estrutural de qualquer mudança
social, mas não justificam a resistência das autoridades em mudar a lei penal.
Frise-se: os indivíduos maiores de 16 e menores de 18 anos possuem, na
atualidade, plena capacidade de entendimento e de volição. Se não houver a
redução da maioridade penal ou o aumento do tempo de internação em unidades Fundação Casa,
o Estado, mais uma vez, será o maior responsável por fomentar a “fábrica” de
criminosos.
A redução da
maioridade penal, portanto, é uma realidade, uma necessidade indiscutível. É
assim nos países mais avançados da Europa, onde se fala entre 14 e 16 anos.
Embora haja
projetos de lei para viabilizar a redução da maioridade penal, no entanto,
cremos que há ainda muita resistência no seio da sociedade, dados, como
dissemos, os diversos aspectos (políticos, ideológicos, biológicos,
psicológicos etc.) que envolvem essa mudança.
Ademais, para que ocorra essa
mudança, só existem dois caminhos jurídicos: um plebiscito, que é o caminho
mais rápido, e uma nova Constituição.
O Direito Revisto – Abr/13
Publicado
originalmente em: Prof. Fernando Capez
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