Por Prof. Damásio Evangelista de Jesus
A violência urbana, que nos faz vítimas todos os
dias, consistente em assaltos, agressões físicas, estupros, sequestros,
homicídios e tantos outros delitos, não é nova, existindo desde épocas remotas.
Atualmente, sua natureza e formas de manifestação expressam-se conforme as
condições das cidades, consideradas estas as regiões urbanas que possuem mais
de 25 mil habitantes, dependendo das condições sociais e econômicas das
comunidades. Assim, nos aglomerados desenvolvidos são cometidos mais crimes
contra a propriedade; nos em desenvolvimento, delitos contra a pessoa, como
lesões corporais e homicídios. Ela é parte do cotidiano das cidades
brasileiras, fazendo com que o Brasil, em 2010, em pesquisa de 2013, tenha sido
o país com o maior número de assassinatos em todo o mundo (Folha de S.Paulo,
14 mar., C4).
Na década de 1970, na França, experiências com
ratos demonstraram que, agrupados em gaiolas, enquanto em pequeno número não se
lesavam. Quando, entretanto, maior o número de animais nas gaiolas, aumentavam
os ataques entre eles, chegando até a formação de quadrilhas para subtrair
alimentos das vítimas. No plano da humanidade, quanto maior o número de
habitantes em uma cidade, maior é o de violência urbana. Nos idos de 1970, as
cidades a partir de 200 mil habitantes começavam a sofrer questões de
delinquência e vitimização. Hoje, em face do progresso da tecnologia e dos
meios de comunicação e transporte, essas ocorrências têm aumentado
significativamente e se espalhado por todas as regiões do Brasil. Não há mais
regiões seguras.
Em certos casos, devido à perseguição da polícia,
há migração de criminosos para zonas em que a repressão é menos intensa,
abarcando sua atividade zonas inteiras, compostas de várias comunidades. É o
que ocorre em determinadas regiões do Estado de São Paulo, nas quais, até
meados de 1960, passavam-se anos e anos sem a prática de homicídios. Em
Marília, interior de São Paulo, onde passei minha infância, durante anos a
prática de homicídio era muito rara. Nos dias atuais, a taxa anual de ataques
físicos tem aumentado cerca de 30%. É o que acontece, por exemplo, na cidade de
Bauru (SP), em que a taxa de homicídios cresceu 30% nos últimos anos. Nas
grandes aglomerações de habitantes, Maceió, a cidade mais violenta do Brasil,
de 2000 a 2010, teve o número de homicídios aumentado extraordinariamente,
chegando a apresentar “áreas vetadas para circulação”, como o Vergel do Lago,
tendo em vista a criminalidade urbana (Folha de S.Paulo, idem, C5).
Circunstância especial a ser apontada, anote-se, é
a construção de presídios fora dos grandes centros. Ao lado deles, em pouco
tempo, mudam-se os familiares de detentos, formando comunidades sem proteção
social.
A violência urbana, na faixa de furtos e roubos a
mão armada, ocorre geralmente nas grandes cidades, onde o número de vítimas
presumivelmente abastadas é maior. Nas cidades menores, a vitimização apontada
alcança o tráfico nacional e internacional de seres humanos, onde se acredita
viverem vítimas menos experientes do que as de grandes centros. Mas nem sempre
isso acontece, uma vez que os autores de pequenos assaltos contentam-se com
quantias pequenas de dinheiro, geralmente na casa dos R$ 10 a R$ 50,00, capazes
de permitir a compra de doses suficientes de maconha e outras drogas de pequeno
valor. Recentemente, as companhias de turismo da França recomendaram que os
visitantes, quando na cidade do Rio de Janeiro, estivessem com R$ 50,00 para
entregar ao ladrão, fato que também já foi recomendado pelos Estados Unidos.
A população urbana de hoje é maior do que o
total mundial de 2000. Acredita-se que, em um futuro bem próximo, 70% das
pessoas passem a viver nas grandes cidades. Entre nós, esse fenômeno social
está ocorrendo há muitos anos, espantando o número de pessoas que, deixando os
campos, transferem-se para as cidades. No interior de São Paulo, não é difícil
ver abandonadas colônias inteiras de casas de fazendas, onde moravam milhares
de famílias de trabalhadores rurais. Nos dias atuais ainda é possível ver, nas
regiões de Duartina, Marília e Arealva (SP), fileiras de casas de colonos
abandonadas por famílias que fugiram para cidades à procura de vida melhor.
Vindo para os grandes centros, engrossam o número
de desabrigados, sem emprego e sem rumo. Em alguns casos, as filhas servem de
vítimas de tráfico sexual internacional; os filhos, às vezes, desabam para as
drogas e o crime contra a propriedade. No interior de São Paulo, temos
conhecimento de alguns filhos de antigos sitiantes e trabalhadores rurais que,
vindo para as cidades grandes, dada a sua possível ingenuidade e falta de
conhecimento dos perigos dos relacionamentos sociais, engrossam a delinquência
juvenil e não raro são confundidos pela polícia como componentes de quadrilhas
especializadas em comércio de drogas, armas de fogo e pequenos assaltos.
No plano constitucional brasileiro, compete ao
Estado, e não ao Município ou à União, a repressão à atividade criminosa. Em
face do aumento da população, os Estados, diante da pequenez da quantia por
eles recebida dos valores dos tributos arrecadados pela União, não têm condições
de proteger os cidadãos nas suas comunidades. Os Municípios, por razões legais
e financeiras, são quase inertes em termos de segurança pública. E as
comunidades, pelas mesmas razões, mostram-se prostradas diante dos furtos,
roubos, sequestros e tantos outros crimes. O resultado é desastroso,
transformando-nos em vítimas pacatas e sem esperança.
Estima-se que, em 2030, 30% dos pobres do mundo
inteiro estejam vivendo nas grandes cidades; em 2050, esse número passará a
50%. Desse total, entre 30% e 70% não terão condições sociais de vida (saúde,
educação, emprego etc.). Nessa época, no Brasil, pesquisa do fim do século
passado sobre nosso futuro indicava a existência de 60% de miseráveis. Temos
esperança de que isso não ocorra.
A prevenção à criminalidade urbana, inclusive a
violenta, só pode ter sucesso por intermédio de uma inclusão humana social,
econômica e política. Não se reduz a criminalidade a níveis razoáveis
unicamente por meio da lei, definindo novos fatos típicos, agravando a resposta
penal e excluindo benefícios dos autores de infrações penais graves. É uma
verdade secular, já vivida pelo nosso País há longos anos com enorme prejuízo à
segurança pública.
A repressão à violência urbana não se faz à força,
como se prendendo criminosos tivéssemos cidades limpas de péssimos indivíduos.
Isso se faz, em primeiro lugar, pela educação, esperando-se resultados
positivos no futuro.
O
Direito Revisto - Abr/13

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