Por
Vander Andrade
IOB – O uso pretérito de drogas pode inviabilizar a
nomeação e a posse em concurso público?
Muitas
vezes tenho sido indagado por candidatos se há argumentos que podem sustentar a
validade de determinados editais
de concursos públicos, especialmente quando estes fazem expressa referência
ao requisito objetivo do aspirante ao cargo não ser dado ou não ter feito uso
de drogas, tornando tal condição, um dado indispensável para a nomeação e
sequencialmente para a posse.
Nesse
ponto, tenho insistido sobre a necessidade de se realizar uma avaliação prévia
de alguns aspectos relevantes: o primeiro diz respeito à natureza e especificidade do cargo,
bem como o das funções que o acompanham; assim, genericamente
considerado, não nos parece fora de propósito, mas ao contrário, entendo
caminhar na direção do interesse público a efetivação de tal exigência em casos
determinados, eis que, a título de exemplo, um concurso destinado ao provimento
do cargo de agente, perito ou delegado
da Polícia Federal tem como escopo escolher aqueles a quem irá competir,
por força de diretriz constitucional, justamente a prevenção e a repressão de
certos delitos, como o de tráfico de drogas, tanto no nível interestadual como
no internacional; já em se tratando do provimento do cargo de fiscal de
tributos, tal requisito poderá soar estranho, posto desconectado do escopo
funcional, o que poderá implicar na necessidade
de se verificar a existência ou não desse elo de imanência entre o cargo, a
função e o requisito exigido.
Já
sob um segundo prisma, é preciso verificar se com relação à prova de tal
requisito, qual foi a
base de verificação utilizada pela Administração Pública, vale
dizer, se foi por meio da análise de um processo criminal (transitado ou não em
julgado), de um inquérito policial, de um termo circunstanciado ou de uma
investigação social; sob a nossa forma de ver, apenas uma sentença condenatória
transitada em julgado pode ser evocada como prova apta a firmar a constatação
efetiva do uso de drogas, eis que pende em favor do candidato-cidadão
determinados princípios constitucionais que não podem ser olvidados, como por
exemplo, o da presunção da inocência.
Ainda
sob um terceiro crivo, torna-se necessário examinar em que momento e em que condições o
uso da droga se configurou; com isso precisamos saber se o uso
constatado, sob o ângulo temporal foi contínuo ou eventual, se ocorreu
durante a juventude ou na adolescência, hipótese em que não poderá
advir nenhuma consequência lesiva aos interesses do candidato, conforme
dispõe o Estatuto da Criança e do Adolescente, ou se o uso se deu por força de
coação moral ou física, apenas para demonstrar o rol de possibilidades que
determinam a imprescindibilidade de um aprofundamento do exame a ser feito caso
a caso pelo Estado.
Contudo,
sobre o tema, o STJ
proclamou entendimento no sentido de que a investigação social se descortina
como instrumento apto a examinar atributos sociais e morais de candidatos, além
dos de natureza criminal. Assim é que a Sexta Turma do Superior Tribunal de
Justiça negou o recurso de candidato em concurso da PM de Rondônia, através do
qual o candidato postulava participar do certame.
No
caso concreto, através
de auto-declaração, o próprio candidato afirmou já ter feito uso de maconha,
e na investigação social que se seguiu, foram juntados dados dando conta de sua
ligação com pessoas de má índole, bem como com problemas relacionais na
vizinhança; para agravar a situação do candidato, teria ele afirmado já haver
integrado os quadros da Administração Pública, alegação esta que restou ser
comprovadamente falsa.
Diante
de tal processo, o STJ reafirmou a jurisprudência daquela Corte, segundo a qual
a investigação social sobre candidato possui o condão de avaliar, dentre outros
fatores, aspectos de
ordem moral e social; foi ainda declinado que as
características da atividade de polícia administrativa “exigem a retidão,
lisura e probidade do agente público”, sendo que os atributos do candidato se
apresentavam incompatíveis com o perfil de um miliciano, posto que o seu munus
público precípuo é justamente o de proteger a sociedade, através da preservação da ordem pública e da
manutenção da paz social.
Os
ministros afirmaram ainda que a Administração Pública havia exercitado com
exatidão o seu poder vinculado, acatando a diretriz do edital e conferindo
correta aplicação ao mandamento legal aplicável à matéria; asseveraram
ainda que a ausência de contestação por parte da defesa não retirava nem
demonstrava de forma cabal a ilegalidade praticada em face da pessoa do
candidato.
Concluindo,
entendemos que a matéria continua bastante controvertida, ensejando discussões
judiciais de alta indagação, caso argumentos aptos a desconsiderar a
generalização que costuma acompanhar a produção de relatórios por demais
subjetivos como os da denominada “investigação social” venham a ser
questionados a partir de determinadas particularidades que podem ser opostas
perante o Estado-Administração, obviamente, quando houver cabimento para tal
debate.
O Direito Revisto – Jul/13
Publicado
originalmente em: Blog Iob Concursos
Imagem: Reprodução Google
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