segunda-feira, 22 de julho de 2013

Drogas dos Concurseiros: Uma Ilusão de Eficiência Cognitiva!



Você já teve contato, já usou ou já ouviu falar das drogas dos concurseiros?

Por Prof. Rogério Neiva

Muito bem, ao que tudo indica, vem ganhando força a ideia do uso de drogas cognitivas no universo da preparação para concursos públicos. Trata-se de um recurso perigoso e ilusório.

Alguns candidatos têm recorrido a substâncias químicas com a intenção de otimizar o processo de estudos. Geralmente estas correspondem ao metilfenidato, mais conhecido como ritalina, e o modafinil. A intenção seria melhorar as funções cognitivas primárias, tais como a atenção e a concentração.

Antes de mais nada, vale lembrar que o referido recurso se trata de uma droga. Segundo o dicionário de Michaelis, droga seria a “designação comum a todas as substâncias ou ingredientes aplicados em tinturaria, química ou farmácia”.

Infelizmente, a postura de adoção indiscriminada do aludido recurso atinge não apenas o mundo da preparação para concursos públicos, mas também já vem, há algum tempo, afetando o universo da educação infantil. Não é incomum que profissionais da saúde ou da educação, diante de problemas de aprendizagem por parte de crianças – principalmente o TDAH (Transtorno do Déficit de Atenção e Hiperatividade), recomendem de imediato o uso da ritalina, sem a tentativa de outros meios ou estratégias de superação da mencionada dificuldade. E há algum consenso no sentido de que diagnósticos são realizados sem os necessários e devidos cuidados.

Mas diante deste cenário, dois aspectos fundamentais exigem consideração. O primeiro seriam os efeitos colaterais e problemas passíveis de ocorrência no futuro. O segundo seria a real eficiência do referido recurso.

Como sei que muitos dos candidatos não se preocupam com o futuro, estando tomados pelo imediatismo e às vezes pelo desespero de busca da aprovação, vou ignorar solenemente a primeira preocupação. Registro que considero positivo este “quase desespero”, pois se traduz em motivação e compromisso com o processo de preparação. No entanto, como tudo na vida, radicalismos e exageros sempre são indesejáveis. Inclusive pelo risco de que a referida intensidade de envolvimento ao longo da trajetória de estudos não se mantenha constante.

Assim, considerando a preocupação-alvo que elegi, saliento que tenho dúvidas sobre a eficiência do uso dos referidos medicamentos. Em tese, a intenção consiste na ampliação da concentração e atenção. Para compreensão da referida atitude, destaco que há um conceito de grande aplicação.

Trata-se da ideia da curva de aprendizagem. A referida construção foi desenvolvida pelo alemão Hermann Ebbinghaus e aperfeiçoada por Theodore Paul Wright. Tal conceito envolve a noção de que o processo de aprendizagem não é necessariamente linear. Ou seja, ao iniciarmos nossos estudos em determinado momento, haverá um ponto ótimo de aproveitamento, após o qual este contará com um comprometimento. A referida idéia se relaciona com um conceito da ciência econômica denominado função utilidade, conforme o qual em processos produtivos existem momentos e situações de otimização positiva ou negativa de resultados.

Ou seja, resumo do resumo: 10 horas seguidas de estudos não são o resultado aritmético de 1 hora vezes 10 de estudos. Assim, não é o fato de tomar um medicamento que permita permanecer 10 horas estudando que garantirá a eficiência de tal processo cognitivo e, principalmente, da apropriação intelectual da informação passível de solicitação no momento da prova. Não custa lembrar que o cérebro conta com uma estrutura bio-fisiológica complexa, não funcionando como uma máquina. Isto é, não é uma questão de trocar a pilha ou colocar uma bateria mais potente.

Neste sentido, outro conceito importante, no plano da formação de memórias, consiste na ideia do limite da capacidade bioquímica instalada, sustentado pelo professor e neurologista Ivan Izquierdo. Segundo defende, “…a sensação quase física que todos experimentamos alguma vez de que, ao acabar determinada atividade intelectual, como um período de estudo intenso ou uma aula, ‘não cabe mais nada em nossa cabeça’ corresponde a um fato real… usa-se, cada vez, uma porcentagem bastante grande da ‘capacidade’ bioquímica ‘instalada’ de nosso hipocampo…” (IZQUIERDO, Ivan. Memória. Porto Alegre: Artmed, p. 46).

E mesmo quanto ao caso de pessoas adequadamente e responsavelmente diagnosticadas como portadoras de TDAH, há estudos indicativos de que em 25% dos casos o medicamento não produz resultados (ROTTA, Newra Tellechea. Transtorno da atenção: aspectos clínicos. In Transtornos da Aprendizagem. Porto Alegre: Artmed, 2006, p. 310).

Porém, apesar deste dado, a presente crítica e alerta não tem por objeto os casos em que há diagnóstico técnico, cuidadoso, sério e ético, com a convicção do profissional responsável de que este é o caminho adequado. O alvo aqui é o uso por aqueles que estão em busca da ilusória pílula mágica da otimização cognitiva.

Recentemente, o periódico “Mente e Cérebro” publicou uma matéria noticiando que alguns cientistas estariam propondo a reflexão sobre a conveniência de adoção das mencionadas substâncias, enquanto meio de otimização cognitiva. No entanto, não deixou de fazer o devido e necessário alerta, ao colocar que “essas drogas devem ser cuidadosamente estudadas para esse fim, e devem ser avaliados seus riscos e benefícios” (Ano XVI, no. 193, pág 21).

Saliento que, apesar da percepção de alguns no sentido da eficiência da busca de drogas cognitivas, considero – em termos de formulação de hipótese, que se trata apenas e tão somente de uma ação de efeito placebo. Não há dúvida que temos a natural capacidade de reagir, inclusive em termos fisiológicos, diante da crença de que determinada substância provoca determinado efeito esperado. Pode ser que por trás da aparente e ilusória vantagem subsista a atuação do referido mecanismo.

Portanto, não tenho dúvida em afirmar que, ao invés da busca de ganhos facilitados e ilusórios, a otimização dos estudos deve ser viabilizada por estratégias e atitudes adequadas, principalmente em termos da estruturação do planejamento da preparação.

Não é preciso muito esforço intelectual para se convencer da importância do cultivo de hábitos saudáveis, em termos físicos e psicológicos, enquanto meio de gerar condições adequadas ao processo de estudo e aprendizagem.

Enfim, espero que você reflita sobre os alertas apontados e manifesto meus votos de que desempenhe uma preparação estratégica, eficiente, racional, de alto rendimento e, acima de tudo, saudável!!!

O Direito Revisto – Jul/13
Publicado originalmente em: Blog Prof. Rogério Neiva

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